terça-feira, 4 de junho de 2013

Capítulo 12 - Parte 7

Pedro e Beatriz foram de carro até a delegacia mais próxima, aguardaram um pouco até serem chamados a prestar queixa.
Beatriz contou em detalhes ao delegado o que havia acontecido desde que chegara ao Brasil, mas preferiu guardar segredo a respeito dos horrores que sofrera na França. Informou apenas que havia tido um envolvimento amoroso com Daniel e que ele a havia agredido fisicamente.
O delegado Félix Alcântara era um homem de meia idade, baixa estatura, ombros largos, rosto marcado por olheiras das noites sem dormir. Havia tido muitas histórias de apreensões de drogas e combate a traficantes memoráveis em sua carreira policial, mas depois de um certo tempo acostumou-se a burocracia e ao sistema penitencial lento que há no Brasil.
A história de Beatriz era apenas mais uma entre tantas as que ele ouvia todos os dias sobre violência doméstica, que acabavam com o indivíduo preso por algum tempo, pela Lei Maria da Penha, ou então com alguma fatalidade. O caso de Beatriz, pelo que ela havia descrevido para ele e também pela experiência acumulada ao longo de anos vendo casos semelhantes, acabaria em tragédia fatalmente. Mas, não havia nada que ele pudesse fazer, até ter provas concretas do que ela estava lhe relatando, o que muitas vezes, acontecia quando já era tarde demais.
Foi com um pesaroso suspiro que o delegado Félix dispensou Beatriz, apertando sua mão e lhe convencendo que iria investigar Daniel e tentaria prendê-lo a todo custo. Mas isso não era verdade.
O boletim de ocorrência feito por ela, ficaria na pilha, junto com centenas de outros que esperavam investigação e que haviam sido lavrados antes. Esse caso, como tantos que haviam chegado às mãos do delegado, teria de esperar.
Beatriz saiu desolada da delegacia. Apesar das palavras de conforto do delegado, dizendo que iria investigar o caso, ela havia percebido que pouco adiantaria o boletim de ocorrência. Daniel continuaria solto e a ameaça à vida dela e a de Caio era cada vez mais iminente.
Uma sensação de abandono se instalou dentro dela. Como poderia, num país tão grande, haver tanta injustiça¿ quantas mulheres faziam queixas como ela, todos os dias e acabavam sendo agredidas novamente ou coisa pior.
A vida não é justa e a lei não protege os que realmente precisam.
Foi remoendo a conversa com o delegado Félix que beatriz voltou para o Cucina Dolce, muito calada, absorta em seus pensamentos a respeito da injustiça que havia no país que chamam de “abençoado por Deus”.
- Se isso é ser abençoado por Deus, então eu não quero acreditar nesse cara. – Beatriz murmurou ainda no carro com Pedro, que dirigia rumo ao restaurante.
Assim que a porta do escritório se abriu e Caio viu Beatriz entrar cabisbaixa, percebeu que a ida à delegacia poderia não ter sido uma boa ideia afinal.
- O que houve meu bem¿ - Caio já estava próximo a beatriz, abraçando-a.
- Não é nada. – Beatriz afundou o rosto contra o peito do namorado, tentando afastar toda a incerteza sobre o futuro.
- Então porque está assim¿ - Caio murmurou baixinho, enquanto afagava os cabelos dela.
- Ah, não vai dar em nada, o delegado até disse que iam investigar e tudo, mas eu sei que não vai acontecer. Havia uma pilha de boletins de ocorrência como o que eu fiz na mesa dele. O meu caso não deve ser o pior que havia ali, Caio, acho que não vamos poder contar com a polícia. – Beatriz terminou de falar com um suspiro profundo, estava cansada daquilo.
- Você contou tudo à ele¿
Beatriz hesitou, havia escondido talvez a parte mais importante de tudo. Agora, estava arrependida, mas não adiantava mais lamentar, se voltasse a delegacia para acrescentar alguma coisa ao seu relato, era provável que perdesse credibilidade quanto ao que falava.
-Bem eu, não contei tudo, não tive coragem de contar o que aconteceu na França, só disse que ele me agredia, mais nada.- A voz de Bia estava baixa e Caio suspirou.
Alguns instantes passaram até que ele dissesse alguma coisa.
- Você tinha que ter contado! Não pode ter tanta vergonha de contar o que aconteceu, já passou Bia! Não foi culpa sua e ninguém vai te julgar!
Ele estava quase gritando, nunca havia falado com Beatriz daquela forma e ela teve que se segurar pra não chorar.
- Eu sei, mas na hora travei. Não consegui. Estraguei tudo droga!
Dizendo isso ela deu as costas e saiu. Foi embora.
Caio ficou parado, as mãos cerradas ao lado do corpo, vendo-a se afastar. Não iria atrás dela, ambos precisavam de um tempo sozinhos.
Beatriz chegou a rua com raiva. Como ele podia não entender o quanto era difícil porá ela falar sobre aquilo¿ Ter que reviver as mesmas cenas que a atormentavam há tantos anos. Cada vez que contava aquilo a alguém era como atravessar uma faca em seu coração e torce-la devagar. Sangrava e doía de forma agoniante. Ela já não suportava aquilo.
Beatriz não chorou. Sentia apenas raiva.

Raiva de si, de Daniel, de Caio, da situação e de tudo o que tinha acontecido. Toda a dor estava tentando sair de alguma forma e ela sabia onde conseguiria extravasar aquilo.


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Boa Leitura!
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