O Nissan 370 Z preto era o xodó
do Chef Tulio, ele jamais colocaria o carro com o qual havia gastado alguns
anos de economia numa estrada de chão, mas foi surpreendido ao se escutar
falando para Beatriz que iria leva-la até a fazenda daquele bronco do Salvador.
Arrependeu-se de imediato, mas
agora já havia falado e não iria voltar atrás. Talvez esse passeio tivesse suas
vantagens, poderia ficar sozinho com ela por alguns momentos.
Ele saiu da garagem do Cucina
Dolce manobrando lentamente seu Nissan, já teria que enfrentar a estrada de
chão, não suportaria um arranhão na lataria do carro também, pois a quantidade
de pilastras de sustentação que haviam naquele estacionamento era algo
impressionante.
Seguiram em silencio até chegarem a bifurcação no caminho, que os
levaria a fazenda de Salvador e para sofrimento de Tulio, pela estrada de chão.
- Merda! – Beatriz ouviu o Chef
ao seu lado resmungar ao passar pelo primeiro de muitos buracos que haviam já
no começo daquela estradinha.
- O senhor não deveria ter vindo
com o seu carro, eu poderia muito bem ter vindo de táxi.
- Eu sei, mas eu quis trazer
você, eu a estou avaliando e preciso saber como vai conduzir a negociação com
ele quando chegar lá, porque se bem conheço aquele velho resmungão ele vai ter
alguma carta na manga.- Chef Tulio estava irritado, e aquilo transparecia na
sua voz, ele mal conseguia se conter, pensando em todas as marcas que aquela
maldita estrada estava deixando no seu carro.
- Está certo então. – Beatriz
baixou a voz quase a um sussurro, direcionou o olhar para a janela do veiculo e
não pronunciou palavra alguma até chegarem ao seu destino. Havia repassado
mentalmente a conversa com Salvador e havia se munido de toda a força interior
que conseguira acumular no trajeto entre o restaurante e a fazenda.
Chef Tulio estacionou o carro na
entrada do lugar, diante da porteira, não queria correr o risco de não
conseguir tirar seu carro dali caso atolasse em algum lamaçal.
Saltaram do Nissan e passaram
pela porteira, caminharam lado a lado por cerca de 500 metros, até avistarem a
sede da fazenda.
Havia uma casa grande, com dois
andares, feita com tijolos maciços pintados com cal, o que dava uma tonalidade
branco-amarelado as paredes externas. As portas antigas eram escuras,
provavelmente de madeira de lei e logo acima da janela mais alta da casa, onde
deveria ser o sótão, via-se a inscrição com a data de construção do lugar:
1926.
Ao lado da casa grande e antiga
havia um celeiro, todo feito em madeira. O celeiro tinha grandes portas que
ocupavam quase toda sua parte frontal. Não era pintado, mas podia-se ver que a
parte exterior estava recoberta por uma fina camada de verniz.
Haviam 2 tratores ao lado do celeiro,
um deles estava preso à um arado, o outro à uma carretinha, onde haviam várias
ferramentas e sacos, que Beatriz percebeu serem de adubo, assim que se
aproximaram um pouco mais do lugar e ela sentiu o cheiro que provinha dali.
Avistaram um homem pequeno, com
cerca de 60 anos saindo de dentro do celeiro. Ele tinha cabelos grisalhos
escondidos embaixo de um chapéu de palha com abas imensamente largas, vestia
uma camisa cinza surrada, calça social que escorregava da cintura, vindo parar
quase no meio da nádega, que ficava com um pedaço à mostra e também sandálias com
tiras de couro entrelaçadas.
Beatriz fitava o homem enquanto ele
se aproximava com uma expressão fechada. Ela imaginou que aquele deveria ser
Salvador. Tulio estava ao seu lado, esperando que o homem se aproximasse mais.
Não se moveram com medo que ele pensasse que estavam invadindo seu território.
Se ele quisesse, os convidaria para conhecer o lugar, se não, pegariam o que
tinham vindo buscar e iriam embora.
Ao chegar mais perto deles,
Salvador reconheceu o Chef Tulio, aquele italiano que ele não suportava. Mas
ele não estava preparado para vislumbrar Beatriz. Ela imediatamente o lembrou
da sua irmã mais nova, que havia morrido quando ainda jovem, há muitos anos atrás,
quando contraiu meningite. Essa semelhança entre as duas o desarmou completamente.
Os 20 minutos que se seguiram foram
de muita conversa, ele os levou para dar uma volta rápida pelo celeiro, mostrou
como estocava os alimentos e entregou-lhes a encomenda que haviam ido buscar.
Assim que colocaram as caixas com
os produtos no carro, despediram-se de Salvador, e foram embora.
Chef Tulio tinha prometido a si
mesmo que não seria grosso novamente com Beatriz no caminho de volta ao
restaurante, queria conversar com ela, saber um pouco mais sobre aquela garota
que o fascinava.
Logo no começo do trajeto de volta
ele começou a conversar com ela.
- Nossa isso foi realmente
inesperado. Eu achei que o Salvador ia expulsar a gente de lá com uma
espingarda na mão.- ele disse e sorriu erguendo o canto dos lábios.
Beatriz sorriu também e completou:
- Eu também achei estranho, ele
estava muito diferente do que quando falei com ele ao telefone, estava tão..-
ela tentou achar uma palavra que descrevesse o que estava pensando a respeito
do comportamento de Salvador-
- Ele estava muito gentil, como se
fossemos conhecidos, ou parentes não sei, achei muito estranho.
- É eu também pensei isso. Mas fico
feliz que tenha dado tudo certo. – Tulio estava realmente impressionado com o
desempenho de Beatriz e tinha certeza que ela daria uma ótima chefe para sua
cozinha. Mas Caio ainda não havia tido sua oportunidade, nem Vitória, que sabia
sim ser muito perigosa.
- Beatriz eu queria lhe dizer uma
coisa e eu não quero que me leve a mal.- Ela o olhou por alguns instantes
intrigada. Ele tinha uma expressão ansiosa no rosto, como se estivesse lutando
para esconder alguma coisa.
- Eu queria dizer que eu fiquei
feliz por você e pelo Caio, considero ele como um filho, mas quero que tome
cuidado.- Ele parecia estar escolhendo as palavras, com medo de dizer algo que
se arrependeria depois.
- Tomar cuidado com o que¿ -
Beatriz soou um pouco ríspida, mas não conseguiu conter aquela exclamação.
- Tomar cuidado para não se
envolver demais. O Caio nunca se apaixonou de verdade por mulher nenhuma e eu
não quero que você saia machucada Beatriz, você é boa e eu não conseguiria
perdoá-lo se ele te magoasse.- Chef Tulio tinha os olhos fixos na estrada,
queria evitar os olhos azuis brilhantes dela, com medo do que poderia encontrar
se os fitasse naquele momento.
- Com todo o respeito Chef Tulio,
esse assunto é entre mim e o Caio. Acho que sou adulta o suficiente para
decidir o quanto me envolver com alguém e não quero que o senhor e nem ninguém
se intrometam no que estamos vivendo. Não acredito que ele vá me magoar, mas se
acontecer, não vai ser o fim do mundo, Chef Tulio, já passei por coisas muito
piores na vida e mais uma cicatriz não irá me matar.
Tulio ficou intrigado com o que ela
disse, o que será que ela havia sofrido no passado, para machucar tanto quanto
ela falava¿ Milhares de respostas cruzaram sua mente, mas nenhuma pareceu
satisfatória.
- Me desculpe, não quero me
intrometer, só quero que todos fiquem bem, afinal, o bom andamento do Cucina
Dolce também depende do humor dos meus funcionários.
Ele achou que seria melhor dar
alguma desculpa que envolvesse o restaurante, pois sabia que se falasse o
quanto se importava com ela iria gerar desconfianças e ele não suportaria que
ela se afastasse.
Logo chegaram ao restaurante, não
haviam mais tocado no assunto e ambos acharam melhor assim.
As verduras foram descarregadas do
Nissan e assim que Beatriz entrou no Cucina Dolce carregando uma ultima sacola
com temperos, Tulio rapidamente foi conferir se havia alguma marca em seu
precioso carro.
- Merda! – Foi o que ele disse,
assim que avistou o risco, que ia de um lado a outro de sua porta, estragando a
linda imagem do seu xodó.
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Aiii pessoal a parte de hoje.
Espero que gostem
beijos a quem lê
=o***
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